Existe vida além das licenças de operação? Um punhado de empresas de tecnologia mexicanas teve que encontrar rotas alternativas e mudar seus negócios, depois que suas solicitações para operar sob a Lei das Fintechs foram atrasadas ou rejeitadas.
Ao contrário de outros países latino-americanos, onde as fintechs podem abrir uma loja sem autorização dos órgãos de controle, tanto empresários quanto investidores, que consideram o México como destino de seu capital, devem ter a licença — e a sua probabilidade de aprovação—como um fator para o bom desempenho de um negócio potencial.
A Flink faz parte desse grupo que não obteve autorização dos reguladores mexicanos para operar. E, na sua opinião, a lei deveria se adequar melhor à realidade mexicana, a fim de promover a criação de empresas.
“A Lei Fintech é recente no México, faz apenas quatro anos que foi promulgada e, como qualquer nova legislação, precisa ser adaptada às demandas do mercado”, diz à iupana Sergio Jiménez, CEO e cofundador da Flink, que, agora, funciona como uma wealthtech e, em maio, deste ano iniciou a aquisição da Vifaru Casa de Bolsa, instituição fiscalizada pela Comissão Nacional de Bancos e Valores Mobiliários (CNBV).
“Uma das melhorias que podem ser aplicadas é que as empresas tenham uma melhor comunicação com o regulador. Isso permitirá conhecer os requisitos e as necessidades de ambas as partes, podendo agilizar a aprovação dos pedidos regulatórios”, acrescenta.
Como consequência, o peso das licenças está levando diversos atores a repensarem suas ações, não apenas para as fintechs que não obtêm autorização, mas também para os órgãos do Estado. Uma fonte gerencial da CNBV disse à iupana que eles estão cientes dos atrasos, mas alegam que o volume de procedimentos que chegam diariamente é grande. “Estamos revisando internamente como tornar as regras de procedimentos e revisões mais eficientes pelas áreas que participam das autorizações”, disse.
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Tempos atrasados
Até agora, 40 fintechs obtiveram a aprovação dos reguladores, algumas após quase três anos de tramitação, como aconteceu com o Mercado Pago. O consenso na indústria é que os tempos de espera são longos, razão pela qual o ex-banco digital Oyster estava inclinado a abandonar seu pedido e mudar seu modelo de negócios para soluções de pagamento para PMEs.
Também levou outros a antecipar compras de instituições financeiras para obter uma licença. Enquanto outros empresários desistiram completamente.
No entanto, para o advogado especialista em fintech, Carlos Valderrama, diretor do Legal Paradox, há divergências sobre o assunto. A firma diz ter notado a recente abertura do regulador para autorizar novas empresas, depois de ter assessorado 30% das fintechs do país.
“A sensação geral é de que é impossível obter autorização e que é muito demorado. Com base na experiência, eu diria que a verdade é não”, assegurou a este meio, em maio deste ano.
A lei mexicana foi promulgada no início de 2018 e permite que as fintechs operem como instituições de fundos de pagamentos eletrônicos (IFPE) — onde entram as carteiras digitais e os credores — ou instituições de financiamento coletivo (IFC).
Até outubro de 2021, 24 sociedades haviam abandonado o processo e 22 empresas foram rejeitadas pelo regulador, de pouco mais de cem solicitações recebidas antes da pandemia, segundo um pedido de transparência feito à CNBV pelo jornal El Economista. A lista dos não aprovados é composta por Propler, Cumplo, PayRetailers e UnDosTres, este último prestando serviços ao unicórnio argentino Ualá em solo mexicano.
Outra fonte dentro da CNBV confirmou que não existe uma lista oficial de empresas rejeitadas e que cada uma está sendo notificada diretamente.
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Experiências da Flink e Cacau
A Flink surgiu em 2018 como uma plataforma digital que viabilizou um cartão de débito. Naquele mesmo ano, teve início o pedido de autorização como IFPE. Em 2020, ampliou sua proposta digital para negociação e, paralelamente, teve seu pedido recusado pela CNBV.
“Quando nossa autorização foi negada, sabíamos que tínhamos que trabalhar de mãos dadas com o regulador para encontrar uma solução na qual continuaríamos oferecendo produtos de investimento inovadores”, diz Jiménez. “O primeiro passo foi obter autorização para operar sob a licença de assessor de investimentos e, então, iniciar o processo de aquisição”, acrescenta.
A compra da corretora ainda aguarda autorização da CNBV. A empresa tem planos de iniciar as operações na Colômbia este ano.
Por sua vez, a Cacao Paycard foi adquirida em dezembro de 2021 pela unicórnio Dock, empresa brasileira de infraestrutura de tecnologia financeira.
Essa operação aconteceu meses após a recusa em atuar como IFPE. A Cacao forneceu soluções digitais financeiras para outras empresas, sob o modelo Fintech as a Service (FaaS), modelo que não tem a aprovação do regulador. Entre seus clientes estavam as empresas Clip, Lana e BNEXT.
Até o momento, as duas primeiras empresas concluíram seus procedimentos e foram aprovadas como IFPEs, enquanto a última, de origem espanhola, anunciou o fim de sua aventura no México.
Com a aquisição, a Cacao fez um rearranjo no modelo de negócios e focou na vertical de processamento de pagamentos com cartão. Além disso, a Dock nomeou os dois fundadores da Cacao, Gerardo Bonilla e Jorge Álvarez, como chefe de receita e chefe de expansão para a América Latina, respectivamente.
Bonilla se recusou a dar entrevista para esta reportagem.
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O desvio da Oyster
A Oyster também sofreu com a negativa da CNBV para Cacao e decidiu migrar seus negócios para solução de pagamento remoto para empresas.
A solicitação da licença do IFPE pode levar mais de um ano, disse Amanda Jacobson, chefe de staff da fintech, em maio. A executiva rejeitou que a decisão se devesse à recusa e disse que via nos pagamentos um produto de valor para as PMEs.
Desde 2019, a Oyster oferece uma carteira digital focada em negócios, fórmula que conseguiu atrair mais de 60 mil clientes, mas o back das contas e cartões de débito foi feito pela Cacao.
Em maio, anunciou que, seguindo sua linha de apoio às PMEs mexicanas, concentraria 100% de seus negócios em soluções de pagamento remoto.
“Lamentamos que não exista um modelo regulatório para FaaS no México”, disse Jacobson, à época.
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