Depois da euforia que a indústria fintech desfrutou, atingindo o seu auge em 2021, os fundadores procuram agora novas vias — e formas — de financiamento, que lhes permitam manter a rentabilidade e as margens de manobra, sem serem limitados por condições demasiado caras no longo prazo. E, no meio, as fintechs dedicadas ao crédito — que representam a maior parte do ecossistema regional e requerem a maior quantidade de recursos para financiar os seus empréstimos — foram especialmente perturbadas por esta realidade.
Por exemplo, para metade das fintechs de crédito na Colômbia, conseguir obter financiamento foi o maior desafio identificado no ano passado, de acordo com o Radar Finnovista. Para contextualizar, em 2021, o investimento em capital de risco atingiu cerca de US$ 16 bilhões, com grandes empresas globais como Softbank ou Tiger assinando cheques de até US$ 400 milhões. Mas esse rápido crescimento foi seguido por um declínio que parece ter sido estabilizado em 2023 (US$ 4 bilhões), voltando aos níveis pré-pandemia, de acordo com a Associação para Investimento de Capital Privado na América Latina (LAVCA).
Além disso, venture debt, que veio suprir parte da procura, concentrou-se em um número reduzido de startups: 71% da dívida foi captada em apenas cinco rodadas de financiamento.
“Há uma lacuna significativa no financiamento, que, normalmente, é preenchida com capital que dilui fortemente a propriedade dos fundadores das plataformas ou com vários tíquetes pequenos e um déficit de balanço”, explica à iupana A.J. Davidson, cofundador e CEO da SixPoint Capital, uma empresa global de investimento focada em plataformas de crédito de mercados emergentes, com ênfase na América Latina.
“Vemos que as capacidades estão sobrecarregadas com muitas condições restritivas; e muitos credores de fintech, especialmente, na América Latina, têm tido dificuldades em expandir os seus negócios, porque não existe uma solução que lhes permita aumentar as suas carteiras”, continua. “Temos que fornecer capital flexível e soluções para que as plataformas possam escalar e construir um histórico”, acrescenta.
Nesse sentido, a empresa construiu um modelo pouco explorado na América Latina de “capital híbrido” que visa a financiar diretamente as carteiras de crédito e não os custos operacionais dos empreendimentos.
Seguindo essa fórmula, em fevereiro, liderou um acordo de US$ 120 milhões com a fintech mexicana Baubap, um dos poucos “megarounds” do ano e que reflete a elevada procura do setor por recursos para conceder créditos.
Proteja o patrimônio
Frequentemente, as fintechs (de vários estágios) se deparam com um dilema: perder ativos em troca de financiamento ou depender do bootstrapping, ou seja, dos recursos dos proprietários, da sua criatividade e, muitas vezes, das suas poupanças e salários.
Diante disto, Baubap afirma que a linha de financiamento acordada este ano tornou-se uma forma alternativa de ultrapassar as adversidades do mercado, sem perder margens de negócio. A fintech utiliza dados alternativos para criar microcréditos móveis de até MXN 5.000 (cerca de US$ 280), com uma estratégia de educação financeira incorporada nos produtos, que procura incentivar o reembolso atempado.
“Ter uma linha de financiamento neste momento permite-nos ter maior flexibilidade na resposta às necessidades do mercado e à procura dos nossos clientes”, explica à iupana Roberto Salcedo, CEO e cofundador da fintech.
A Baubap foi fundada em 2018 e o financiamento corresponde a uma pré-rodada série A.
Esse tipo de operação é realizada por meio da securitização da carteira de crédito da fintech, que é colocada em um trust, onde é recebido o investimento da SixPoint. Assim, os recursos são direcionados diretamente aos solicitantes dos empréstimos e não aos custos operacionais da empresa, sem diluição do patrimônio. A financeira também utiliza integração tecnológica para acompanhar em tempo real as operações das fintechs de sua carteira, desde a originação até a cobrança, pois, logicamente, o sucesso do seu retorno depende do bom desempenho da carteira de crédito.
Sobre este último ponto, embora não revele a sua taxa de inadimplência, Salcedo reconhece que o contexto econômico leva a uma revisão constante das taxas de inadimplência. “As expectativas de comportamento da inadimplência podem variar dependendo de diversos fatores, como a qualidade da carteira de crédito, as condições econômicas e o perfil de risco dos clientes”, observa. A empresa usa inteligência artificial para tentar antecipar a disposição de pagar dos clientes.
O efeito deste novo canal de financiamento na rentabilidade dependerá também de vários factores, prossegue o CEO: “das condições da linha de crédito (taxas de juro, comissões, prazos), da eficiência na gestão de custos e riscos, e da capacidade de geração de rendimento por meio da intermediação financeira”, afirma.
Agora, a Baubap prepara-se para solicitar uma nova licença de funcionamento (é uma Sociedade Financeira de Propósitos Múltiplos ou Sofome), que lhes permite captar recursos do público e emprestar com ele.