Grandes bancos, fintechs e investidores têm ido às compras em busca de soluções para agregar inteligência artificial (IA) em suas operações diárias, seja para prevenir fraudes, seja para criar ofertas contextuais de produtos, num sinal do crescente interesse que esta tecnologia desperta na América Latina.
Fundos e entidades de investimento disseram à iupana que procuram integrar ferramentas de aprendizado de máquina nos seus portfólios e canais digitais, para permitir casos de uso que vão muito além de assistentes virtuais ou chatbots.
“Estamos aqui precisamente para isso”, afirmou o responsável pelo banco digital de uma entidade mexicana com 20 milhões de usuários em seu aplicativo, ao participar, na semana passada, no Finnosummit, evento na Cidade do México onde se reuniram os principais players do setor das finanças digitais. “Procuramos soluções que nos ajudem a adicionar IA à nossa aplicação, que nos permitam apresentar ofertas, não apenas que interajam com a questão do cliente, mas que possam reconhecer padrões e fazer propostas. Por exemplo, se um cliente viaja muito, promoções para compra de passagens”, listou.
“Além disso, para prevenção de fraudes, que é a área à qual mais trabalhamos, precisamos identificar melhor os padrões de uso da conta e gerar alertas para bloquear o acesso, se suspeitarmos que a conta está sendo usada por alguém não autorizado”, disse a pessoa que pediu anonimato por não ter autorização para falar com a imprensa.
Neste sentido, as capacidades da IA na prevenção de fraudes são promissoras. As maiores violações de contas não ocorrem devido à invasão de plataformas ou aplicativos, mas como produto de engenharia social: quando pessoas, inadvertidamente ou sob engano, compartilham suas senhas com criminosos cibernéticos.
Nesse caso, a análise comportamental pode ser útil para levantar sinais de alerta quando um cliente, ou grupo de clientes, altera significativamente seu padrão. A expansão da IA poderia até permitir a substituição de senhas, de acordo com um grupo de especialistas que participou recentemente de um webinar iupana.
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IA no portfólio
Assim, não surpreende que um dos temas transversais do Finnosummit, na semana passada, tenha sido a próxima geração de inteligência artificial e as diferentes formas de abordá-la no lado financeiro, algo ainda incipiente nos mercados da região.
Apesar do hype gerado pelas ferramentas de linguagem natural do ChatGPT, a realidade é que as empresas financeiras da região estão apenas começando a abordar estas ferramentas, especialmente, a IA generativa. A partir de agora, a tecnologia começará a ser, cada vez mais, implantada em serviços.
“Há uma tese que estamos desenvolvendo, sobretudo, sobre inteligência artificial e que é transversal a tudo: questões de fintech, logística, recursos humanos”, explicou Fabricio Zabala, head of portfolio da Wayra Hispam, braço de investimento e inovação da multinacional de telecomunicações Telefónica.
Zabala disse que estão focando suas próximas colocações principalmente em startups de IA nos Estados Unidos, com interesse em implantar suas soluções na América Latina. Uma vez acordado o investimento, também prestam aconselhamento e apoio no processo de internacionalização, ao mesmo tempo que os promovem comercialmente junto de potenciais clientes.
Por exemplo, estão chegando a um acordo com uma startup dos Estados Unidos que utiliza linguagem natural para interpretar o estado de espírito dos trabalhadores de uma empresa. A ferramenta acessa os e-mails dos funcionários para ler o que eles escrevem em suas comunicações diárias, a fim de fornecer alertas sobre as preocupações dos funcionários. “Todas as informações são anônimas. Mas, em grupos mínimos de cinco pessoas, diz: ‘cuidado, porque esse grupo tem alta probabilidade de burnout ou tem alta probabilidade de rotatividade’”, explicou o investidor.
“A Telefónica/Movistar vai até seus clientes e oferece internet, televisão, telefone. Mas também pergunta: como você mede o clima e o desempenho da sua equipe? Lá também podemos oferecer a eles o serviço das nossas startups e aumentar o tíquete”, acrescentou.
O fundo corporativo, que tem credores digitais como Kubo Financiero ou Addi em seu portfólio, está aberto para fechar aportes entre US$ 100 mil e US$ 400 mil em estágios iniciais, do seed à série A.
Banco inteligente
Este tipo de ferramenta também pode ser aplicada para gerar alertas comerciais em serviços financeiros. Por exemplo, para permitir que os bancos compreendam melhor o apetite de compra de um grupo de clientes ou investiguem as suas necessidades de poupança ou empréstimo.
“Usamos inteligência artificial para entender dados financeiros, transnacionais — o que é pagamento, o que é receita — e organizá-los em diferentes categorias e, assim, ajudar o banco a entender os hábitos financeiros de seus clientes. A partir disso, eles podem oferecer o produto certo, na hora certa, para a pessoa certa e combiná-lo com seu mercado”, explicou Juan José Gómez, diretor de marketing da Coinscrap, startup espanhola que está desembarcando no México.
Em casa, faziam parte da aceleradora Santander, que hoje é seu cliente. O mesmo aconteceu com a seguradora Mapfre, que passou de investidora a compradora de sua tecnologia.
Gómez destaca que os bancos quase não utilizam as enormes quantidades de dados transacionais que acumularam após décadas de serviço. Os especialistas em dados realçam que as entidades sofrem frequentemente com barreiras de “dados sujos”: a informação está dispersa em diferentes fontes, é impossível de traduzir ou é obsoleta.
Até agora, o sistema financeiro tem aproveitado muito mais a IA analítica, que utiliza dados passados para fazer previsões futuras, para organizar a sua informação. E, em menor grau, têm utilizado IA preditiva (como ChatGPT), que gera conteúdo e cria propostas. Este paradigma está prestes a mudar.
“A inteligência artificial generativa vai ajudar a crescer muito esse negócio. Não é mais um chatbot. Agora, é realmente como um verdadeiro assessor. “Vamos conseguir curar esses dados bancários e poder, como as pessoas falam, poder dizer ao cliente, conheço os seus hábitos de consumo, sei quanto ganha, sei quanto gasta, posso fazer uma previsão de para onde você está indo", concluiu.