Um grupo crescente de fintechs está lutando para capturar clientes PMEs desconfiados, um mercado que, tradicionalmente, resiste às finanças. Para isso, elas estão aproveitando os dados de seus serviços de pagamento para aprofundar sua oferta financeira – e não financeira — digital.
O unicórnio mexicano Clip é um exemplo da tendência. A empresa que ganhou tração por oferecer um leitor de cartão portátil associado ao aplicativo adicionado, no fim de 2020, ao seu primeiro serviço financeiro, um crédito que pode ser contratado digitalmente e cujos pagamentos são descontados nas vendas do comércio.
Mais recentemente, em meados de 2021, lançou sua plataforma Clip Empresas, que permite que terminais estejam vinculados a softwares de gestão para implantar um painel de controle mostrando o desempenho geral do negócio, como receita diária ou registros de vendas: todos os serviços, não necessariamente convencionais ou financeiros, mas com os quais esperam captar a atenção dos comerciantes.
“Os dados históricos [no app] são os que geram essas opções e ofertas que podemos conceder a eles, porque, hoje, o que eles estão exigindo é liquidez para poder modernizar seus negócios, poder expandi-los. Há opções como a nossa que permitem que eles tenham acesso a esses avanços monetários”, disse Ricardo Muñoz, diretor de marketing da Clip, à iupana.
“O desafio que temos é como estamos inovando e como estamos complementando o portfólio”, diz ele. “Estamos procurando competir contra o dinheiro.”
Apesar de representar 99% das indústrias da região, 70% das micro, pequenas e médias empresas são informais, segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL). Essa característica limita suas oportunidades de acesso a produtos financeiros, como crédito por meio de canais tradicionais, mas abre novos caminhos e mostra um enorme mercado disponível para instituições alternativas, como fintechs.
A Treinta, uma solução contábil para empresas em que as receitas e despesas do comércio são organizadas e apresentadas visualmente, revelou à iupana que está experimentando a habilitação de empréstimos às PMEs utilizando dados de vendas inseridos pelos comerciantes em sua aplicação.
A fintech colombiana, presente em 18 países da América Latina, também lançará até julho seu serviço de PDV para empresas na Colômbia, que será integrado à sua aplicação. Isso permitirá uma melhor e mais eficiente captura de dados, o que reforçará sua estratégia alternativa de empréstimo, ao mesmo tempo em que lhes trará renda adicional das comissões geradas.
“O fato de conhecermos os dados – que não compartilhamos ou vendemos – nos permitirá oferecer a outros candidatos a crédito, melhores condições do que alcançariam no setor financeiro tradicional”, diz Lluis Cañadell, cofundador da Treinta, afirmando que eles atingiram 4 milhões de empresas desde o seu lançamento em 2020.
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Pagamentos para PMEs: porta para a inovação
Por sua vez, a Tribal, fintech mexicana de ferramentas digitais para empresas, já está entregando créditos e destaca que pode viabilizar valores entre US$ 10.000 e US$ 2 milhões, dependendo do volume de cada empresa e com base em seu próprio modelo de risco.
Sonia Michaca, gerente regional da Tribal para a América Latina, diz que seu crescimento de usuários no México aumentou “para dois dígitos, mês a mês, com um total de 90% durante 2021”, e que as empresas que utilizam sua plataforma têm uma avaliação alternativa de crédito.
“Um deles é o nosso modelo de underwriting:: temos um score com diferentes variáveis que avaliamos para ver a capacidade de pagamento, o risco que as empresas têm”, explica Michaca, acrescentando que eles completam essas informações fazendo o cruzamento com o Serviço de Administração Tributária (SAT) do México e com demonstrações de contas das empresas.
As PMEs latino-americanas historicamente têm uma relação distante com os bancos. Por exemplo, no México, apenas 23,7% das pequenas empresas obtiveram financiamento, de acordo com um estudo da IPADE Business School e da empresa de tecnologia Bring Global, publicado em novembro de 2021.
Nesse contexto, trazer serviços às PMEs representa um oceano azul. Mas, para capitalizar, as fintechs devem superar as mesmas barreiras que seus concorrentes: custos, facilidade de uso e desconfiança.
Uma dica para começar a ganhar o setor é primeiro oferecer-lhes serviços de pagamento simplificados, um segmento fundamental para cada negócio.
Nessa linha, a Tribal identificou que o pagamento a fornecedores internacionais é uma das principais dores para as empresas, tanto pequenas como grandes.
Em parceria com a Stellar, um protocolo de finanças descentralizadas (DeFi), e a plataforma de câmbio mexicana Bitso, a Tribal criou um sistema de pagamento transfronteiriço que agiliza o processo com o uso de criptomoedas.
“Estamos fazendo transferências internacionais através do USDC (USD Coin), com moedas estáveis, o que nos permite ser muito mais eficientes porque, em tempos, uma transação pode ser aplicada em cinco segundos e com custos quase zero”, diz Michaca.
A fintech, inicialmente, oferecia cartões de crédito corporativos. Agora, suas soluções chegam à folha de pagamento por meio de sua plataforma e iniciou suas operações, no ano passado, na Colômbia, no Chile e no Peru ao mesmo tempo e, neste ano, foi lançado no Brasil.
Sem dúvida, histórias de sucesso como Nubank e Rappi estão conseguindo mudar a percepção geral de novas empresas de serviços financeiros.
“Acho que o principal desafio que as PMEs tiveram foi quebrar o tabu da tecnologia”, acrescenta Muñoz, da Clip.