O avanço das big techs no mercado financeiro não preocupa a PagoNxt. A fintech do banco espanhol Santander acredita que a incursão de empresas como a Apple no processamento de pagamentos abrirá oportunidades para novos negócios.
A PagoNxt foi criada no fim de 2020 para reunir as operações de pagamento do Grupo Santander sob um único guarda-chuva. Isso inclui a Getnet, no segmento de adquirência para empresas, e a carteira eletrônica Superdigital, que oferece pagamentos móveis para pessoas físicas.
É também a aposta do Santander em abordar estrategicamente os pagamentos digitais verticais, um dos que mais crescem como resultado da pandemia e da decolagem das compras online. O grupo disse em fevereiro, quando publicou seus resultados financeiros de 2021, que a fintech continuará entre suas prioridades nos próximos anos, de acordo com seu interesse em se tornar uma plataforma de serviços que dê preponderância à tecnologia financeira e às tendências digitais.
Mas este objetivo a coloca em concorrência direta com empresas de tecnologia como Google, Stripe ou PayPal que têm propostas de valor baseadas na simplificação de operações que, tradicionalmente, têm sido tratadas pelos bancos, tais como aquisições, pagamentos domésticos e transfronteiriços ou remessas.
Entretanto, a empresa espera capitalizar alianças em vez de rivalidades com os gigantes da tecnologia.
“Isto pode abrir oportunidades em certos mercados, como na América Latina ou na Europa, e pode levar a potenciais acordos”, disse à iupana, desde Madri, Daniel Pujazón, policy lead da PagoNxt.
A Apple anunciou planos para introduzir o Tap to Pay no iPhone, para permitir que os comerciantes nos EUA utilizem o smartphone para aceitar o Apple Pay, cartões de crédito e débito sem contato e outras carteiras digitais, sem a necessidade de hardware adicional ou um terminal de pagamento. A empresa baseada em Cupertino também oferecerá a funcionalidade para plataformas de pagamento e desenvolvedores de aplicativos, começando com Stripe, que será a primeira a oferecer Tap to Pay a seus clientes comerciantes.
A Apple disse à iupana que ainda não há informações sobre a chegada do recurso à América Latina.
Entretanto, Pujazón, da PagoNxt, diz que uma expansão potencial do serviço para outros mercados fora dos EUA poderia abrir oportunidades para a Getnet, especificamente, para a “aquisição” de dispositivos iPhone.
“Acho que a grande vantagem da Getnet em adaptar-se a diferentes ambientes pode nos permitir chegar a acordos com uma Apple ou qualquer outra empresa que esteja prestando serviços onde os serviços da Getnet ou qualquer uma das verticais da PagoNxt se encaixem”, acrescenta Pujazón.
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Futuro sem dinheiro na AL
O uso de dinheiro continua a dominar na região da América Latina (AL), mas o crescimento dos pagamentos eletrônicos é inegável.
Durante o ano de 2020, mais de 50% dos adultos bancarizados em sete países latino-americanos disseram ter reduzido ou abandonado os pagamentos em dinheiro, de acordo com um relatório da Minsait Payments.
Pujazón destaca iniciativas oficiais como Pix, no Brasil, e CoDi, no México, e observa que o desaparecimento dos pagamentos em dinheiro “é algo que está acontecendo”, o que abre possibilidades para as plataformas que estão entrando na região.
“Estamos fazendo apostas muito claras nos pagamentos eletrônicos e em todo o universo do comércio eletrônico. Temos um posicionamento muito relevante em vários mercados e estamos exportando este posicionamento por meio de aquisições ou acordos com certas empresas”, diz o executivo.
“Nosso objetivo é ser o principal fornecedor de pagamentos na América Latina dentro de alguns anos”, acrescenta Yann Lafargue, diretor-global de marketing e comunicação do Santander Digital, também ementrevista com a iupana.
Para tanto, continuarão a fortalecer seu papel ativo no segmento de aquisição, especialmente no comércio eletrônico, onde capitalizam mais de 30% do mercado no Brasil — a principal economia da região —, o que os coloca em primeiro lugar nesta vertical naquele país. Ele também afirmou que eles estão crescendo em todos os seus mercados.
A Getnet alcançou quotas de mercado em volume total de pagamentos de mais de 15% no Brasil e México até 2021, e lançou operações comerciais no Chile e no Uruguai.
Por sua vez, a Superdigital será usada para capturar clientes não bancarizados e sub-bancarizados, um vasto segmento na América Latina, onde se estima que quase metade da população não tenha acesso a produtos financeiros.
“No Superdigital, vamos ter mais lançamentos em países como Peru, Colômbia e Uruguai. Há um roteiro para estar em sete países dentro dos próximos meses”, revela Lafargue. A carteira já está disponível no Brasil, México, Argentina e Chile.
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O descompasso entre a regulamentação analógica e a realidade digital
Apesar da possibilidade de formar ambientes colaborativos com as big techs, a PagoNxt destacou um descompasso entre a regulamentação existente e a realidade dos negócios digitais, enfatizando a necessidade de regras mais flexíveis que se adaptem às mudanças no setor.
No passado, Ana Botín, CEO do Santander, também alertou para a existência de um “campo de jogo desigual” entre a regulamentação aplicada aos bancos e aquela criada para as fintechs ou as big techs.
Fazendo eco disto, Pujazón escreveu recentemente que uma grande empresa de tecnologia pode fornecer serviços de pagamentos com uma licença leve, enquanto a PagoNxt, embora seja
uma empresa autônoma do Grupo, deve cumprir as normas aplicadas aos bancos para oferecer a mesma atividade.
“Não é que [as empresas de tecnologia] estejam fora da lei, mas elas estão vivendo naquele descompasso que existe entre a regulamentação analógica e a realidade digital”, diz Pujazón.
Em meados de fevereiro, o Mercado Pago começou a operar como um iniciador de pagamentos no Brasil, sob uma licença obtida em face à implantação de open banking, num exemplo da flexibilidade que os países podem ter em termos de suas regulamentações, já que a legislação brasileira vem se adaptando ao panorama, permitindo a entrada de novas empresas.
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PagoNxt aposta em dados abertos
Para a PagoNxt, o avanço de open banking será positivo, porque permitirá a criação de modelos de negócios em benefício do consumidor. Entretanto, eles preferem ampliar o conceito em direção a dados abertos.
Na região, open banking está ganhando terreno. O Brasil está liderando sua implementação e os players do mercado digital advertiram que o modelo, apesar de mostrar sinais interessantes, alcançará seu verdadeiro potencial quando mais usuários concordarem em compartilhar seus dados.
No México, a perspectiva é um pouco mais reservada, dada a demora do regulador em publicar as regras que irão reger o sistema. O HSBC até mesmo disse duvidar que open banking produza modelos de negócios lucrativos para os usuários ou para o sistema.
“Os dados têm que ser vistos da perspectiva do cliente e não da perspectiva de uma determinada vertical”, acrescenta o executivo, ao mesmo tempo em que aponta que é necessário desenvolver estratégias que coloquem o cliente no centro.
“Deixe o cliente decidir com quem vai compartilhar seus dados e para qual finalidade”, diz ele.